quinta-feira, 12 de julho de 2007

Matemática: Resultados 2007


Não me é fácil escrever sobre os resultados dos exames de Matemática.
Sou professor da disciplina e estou também ligado ao processo de classificação de algumas destas provas. Entendo que deve haver lugar a bastante ponderação naquilo que se diz e escreve sobre o assunto.
O tema é demasiado importante para ser tratado de um modo superficial ou, unicamente, como objecto de arremesso, quer seja político, corporativo ou até social. Trata-se de analisar uma vertente essencial na estrutura de uma sociedade: a forma como se desenvolve e realiza o processo de aquisição de conhecimento dos seus jovens.
Neste pressuposto, deve começar-se por definir, claramente, o que está em discussão. Entendo que deve haver lugar à separação desta reflexão em dois temas que, embora directamente relacionados, devem neste momento ser discutidos separadamente:

Primeiro: Os resultados de 2007 das provas de Matemática (Exames Nacionais) até agora realizados.

Segundo: Os factores essenciais que contribuem para estes resultados, quer no presente ano, quer nos anteriores.

Este segundo tema é o mais importante, é o que merece a nossa reflexão. Dele falarei proximamente.
Hoje, por uma questão de actualidade, abordo o primeiro tema que só existe como objecto de discussão porque (coincidência ou não!) se verificou neste ano de 2007 uma série de ocorrências que, em conjunto, lhe deram sentido. Caso tais factualidades não tivessem acontecido este tema nem merecia reflexão. Tais ocorrências são, basicamente:

·O PAM – Plano de Acção da Matemática.
· Na prova de exame código 635 (Matemática A – 1ª fase, 12º Ano) registaram-se as melhores médias dos últimos dez anos. Pela primeira vez, a fasquia do 10 foi ultrapassada (alunos internos).
· A prova de exame código 23 (Matemática, 3º Ciclo do Ensino Básico) registou os piores resultados da sua (curta) história. Aproximadamente 72,8% dos alunos não atingiram a nota 3 e cerca de um quarto registaram nível 1.
· Na prova de exame código 22 (Língua Portuguesa, 3º Ciclo do Ensino Básico) 86,4% dos alunos obtiveram nota superior ou igual a 3. Trata-se de um resultado assinalável quando comparado com o de 2006 (54,5%)!

Conjugando as quatro ocorrências temos o paradoxo que motiva este primeiro tema:
Os resultados melhoraram onde nenhuma medida extraordinária foi implementada. Pioraram onde, durante um ano lectivo, se investiu na aplicação de um plano.

Como interpretar e explicar isto?
Será admissível concluir sobre o PAM? Que ele falhou ou que ainda é cedo para dele extrair resultados reais? Poderemos agora dizer que o PAM não passa de uma medida de marketing político destinado a desviar a atenção do cerne do problema e que tem como único propósito dizer que se fez alguma coisa?
Será admissível concluir sobre os alunos que realizaram as provas? Que estavam menos ou mais bem preparados? Que têm mais competências matemáticas os alunos que concluíram o 12º Ano agora do que aqueles que o fizeram em 2006? Que têm menos competências matemáticas os alunos que concluíram o 9º Ano agora do que aqueles que o fizeram o ano passado? Que haverá diferenças assim tão significativas no uso da Língua Portuguesa entre os alunos que concluíram o 9º Ano em 2007 e os que o fizeram em 2006?
Será admissível concluir sobre os professores que prepararam os alunos? Que trabalharam melhor ou pior? Que interpretaram melhor ou pior as orientações dos programas?
Enfim, e em conclusão, será admissível extrapolar dos resultados destes exames o sucesso/insucesso educativo nas disciplinas de Matemática e de Língua Portuguesa?
Admito as questões mas recuso as conclusões. Não é possível aferir sucesso ou insucesso a partir dos resultados de, apenas, um ano lectivo. Recuso, por isso, as declarações optimistas daqueles que se apressaram a comentar os resultados da prova de exame código 635 (Matemática A – 1ª fase, 12º Ano) e a chamar para si os louros das (sensíveis) melhorias. Recuso também as projecções e intenções dos que achavam que os resultados da prova de exame código 23 (Matemática, 3º Ciclo do Ensino Básico) não podiam ser piores. Recuso ainda a ideia simplista de que, em educação, é possível aplicar ou copiar modelos causa/efeito, vigentes noutras áreas, e que rapidamente produzem resultados. Para analisar o sucesso da Matemática não podemos visualizar os resultados de um patamar em que apenas enxergamos o ano de 2007. Temos que alargar o campo de visão e recuar alguns anos, ou talvez algumas décadas. Mas essa análise diz respeito ao segundo tema que formulei.
Voltemos ao primeiro:
Os resultados obtidos nos exames de Matemática dependem de muitas variáveis. No caso da prova de exame código 23 (Matemática, 3º Ciclo do Ensino Básico) o PAM passou a ser mais uma delas.
Será possível aferir o peso dessas variáveis? Haverá alguma cujo valor seja determinante para o resultado final?
São perguntas de resposta difícil. Convenhamos que se já é complicado definir todas essas variáveis, quanto mais não será atribuir-lhes quantificação!
No entanto, há algumas variáveis que devem manter valores próximos de ano para ano. Só assim será possível suportar a coerência do sistema de avaliação externa e garantir bases estáveis de comparação entre anos lectivos. Só deste modo poderemos aferir o sucesso do processo de ensino/aprendizagem.
A meu ver, o paradoxo anteriormente enunciado desaparece quando se focaliza a questão dos resultados dos exames de 2007 nestas variáveis que cujo valor se deve manter mais ou menos constante de ano para ano. Penso que há duas dessas variáveis fundamentais que assumiram valores substancialmente diferentes neste ano de 2007.
A primeira é a variável tempo de realização da prova que, no caso da prova de exame código 635 (Matemática A – 1ª fase, 12º Ano), este ano se alterou. O seu valor passou de 120 para 150 minutos. Aqui não há lugar a subjectividade. Foi um facto. Houve mais tempo para resolver. Houve mais tempo para pensar. Houve mais tempo para rever.

A segunda é a variável dificuldade da prova. Todos nós, professores, temos a noção, talvez percepção, do nível de dificuldade que determinada questão, teste ou prova de exame tem para a generalidade dos alunos. Sentimos isso, particularmente, nos exames de Matemática de 2007, quer no de 12º, quer no do 3º Ciclo do Ensino Básico. E porque não dizê-lo, também o sentimos na prova de Língua Portuguesa do 3º Ciclo do Ensino Básico.
A respeito da variável dificuldade concordo com os pareceres que a SPM (Sociedade Portuguesa de Matemática) publicou sobre os Exames Nacionais até agora realizados (http://www.spm.pt/files/notas3ociclo1.pdf e http://www.spm.pt/files/mediasnacionais.pdf). Gostaria até de salientar algumas linhas presentes nos dois documentos:
Relativamente às provas do 3º Ciclo do Ensino Básico:
De qualquer maneira, é de salientar que as provas não têm sido construídas de forma consistente de ano para ano e que a sua comparação é difícil. Nesse aspecto, a milagrosa melhoria conseguida a Português é, no mínimo, chocante”.
Relativamente à prova de Matemática do 12º Ano:
Conforme já afirmámos, o exame foi mais simples, atendendo à forma como foram colocadas as questões. Esta prova apresentou questões menos laboriosas e de uma forma mais clara, em termos de organização das ideias”.
A variável dificuldade não manteve, pois, a constância desejada.

Depois há ainda outros aspectos específicos às provas que poderiam ser abordados e contribuem também de um modo decisivo para os resultados finais. Refiro a relação entre a cotação definida para uma dada questão e a dificuldade e o trabalho de resolução dessa mesma questão. Observe-se que não estou a afirmar que houve desrespeito pelo peso de cada tema do programa. O que penso é que, particularmente na prova de 12º ano, é preciso equacionar com mais cuidado essa relação.
Refiro ainda os critérios específicos de correcção (que todos devemos respeitar escrupulosamente) mas que, às vezes, superam a nossa capacidade de entendimento.

Em síntese: as alterações verificadas nas médias dos resultados das provas de exame de Matemática realizadas até agora neste ano de 2007 resultam, essencialmente, de factores inerentes às próprias provas. No que respeita ao que é importante, a aprendizagem, o conhecimento adquirido e as competências evidenciadas pelos alunos, não parece ter havido diferenças substanciais em relação ao que tem sido o quadro dos últimos anos em Portugal.

1 comentário:

piupardo disse...

Concordo. Queres uma ajudinha? Relativamente à média nacional, os "meus" tiveram piores resultados no 12º ano e melhores em 10% no 9º ano(ainda assim, 61% de negativas!). Cá, O PAM centrou-se (só) no 7º ano.
A Língua Portuguesa (9º) tivemos resultados melhores 8% que a média nacional (96% - 88%), sem Plano de Acção.
Os "meus" Professores de Matemática querem, em 2007/08, largar o 8º ano e passar o PAM directamente para o 9º, em busca de melhores resultados nos exames.
Tramado, não é? O mais certo é não adiantar (muito? nada?).
Mas o esforço e a vontade moram aqui, que se há-de fazer?? ...